Fernando Machado

Réquiem a Capiba

A cidade se apresenta vestida de luzes e cores, povoada por grandes bonecos, sombrinhas multicoloridas, guizos, risos e sons dos mascarados, que surgem em cada esquina, enquanto passistas ansiosos aguardam os primeiros acordes de uma fanfarra de metais. Rostos pintados, a esconder semblantes antes tristonhos, desfilam apressados diante de mim, fazendo anunciar a volta do reino azul da folia de há muito esperado por endiabrados foliões.

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Capiba quando criança (Fotos: Arquivo)

Ao meu lado, no entanto, está faltando alguém… Está faltando ele, que por mais de trinta carnavais foi meu companheiro neste mesmo reino azul da fantasia. Carnavais em que juntos cantávamos, acompanhando a multidão, os seus sucessos. Tempos dos Bailes da Saudade, iniciados por mim em 1972, juntamente com Aldo Paes Barreto, e por dezoito vezes repetidos. Ao seu lado a vida parecia nunca ter fim e sua presença seria uma constante até o final de nossa caminhada.

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Capiba em tempo de galã

Ao contrário da regra geral, de que nos fala o poeta Carlos Pena Filho, o Recife não foi para ele a cidade ingrata. Muito pelo contrário, era ele festejado em qualquer parte onde estivesse por velhos e moços e, sobretudo, pelas crianças que por ele tinha um carinho todo especial. Nos últimos dias de 1997, Capiba, o meu companheiro de mais de trinta carnavais, começou a ensaiar o seu adeus. E eu que acreditava na sua eternidade senti, no último encontro, o sabor da despedida.

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Capiba tinha orgulho do nosso Santa Cruz

De mansinho ele se foi do meu convívio e hoje, quando começa mais um Carnaval sem a sua presença, é que eu sinto a falta que ele me faz. Hoje, com a cidade tomada por risos dourados e bocas pintadas a cantar as suas melodias, enchendo de sons os mais tristes recantos, vejo-me vagando pelas ruas, como um órfão perdido no meio dessa multidão, procurando enganar os meus próprios sentimentos. (Pelo jornalista e pesquisador Leonardo Dantas Silva)

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